O uso medicinal da Cannabis sativa L. tem registro na história há mais de 5 mil anos e o cânhamo era usado para produzir diversos produtos têxteis, cordas, tecidos e papel.

A cultura proibicionista começou nos Estados Unidos, durante a Lei seca, que proibia à produção e a comercialização de bebidas alcoólicas nos anos 1920. Com a restrição do álcool a maconha, antes restrita às minorias mexicanas começou a ser consumida de forma mais ampla. Sua proibição e perseguição insere-se numa combinação de preconceito contra minorias, interesses industriais e moralismo religioso, que levou ao banimento do uso medicinal da maconha na maioria dos países na década de 1930.

O sistema canabidiol foi descoberto por Raphael Mechoulam em 1963, mas somente há 30 anos vimos crescer a pesquisa do Sistema Endocanabinóide – SES, que é um conjunto de receptores e enzimas que trabalham como sinalizadores entre as células e os processos do corpo. Mesmo com sua comprovação científica não foi o suficiente para mudar o panorama proibicionista e, ainda hoje, passado mais de 50 anos, há muito preconceito e estigma com os diferentes usos da maconha.

 Veja o documentário sobre a história da descoberta feito por Klein&Fundación Canna, em 2016.

Vemos que somente recentemente, a Cannabis, bem como os compostos quimicamente relacionados, voltaram a ser considerados em seu valor terapêutico. Dr. Raphael Mechoulam, considerado mundialmente como pai do sistema endocanabinóide, juntamente com o Dr. Elisaldo Carlini, trabalharam juntos, como muitos outros cientistas do mundo. A primeira investigação científica a testar o efeito do CBD para a Epilepsia no Brasil foi feita pelo grupo do Dr. Elisaldo Carlini/UNIFESP, pioneiro no estudo dos endocanabinóides, nas décadas de 1970 e 1980, e  liderou no Brasil um grupo de pesquisa publicando vários artigos sobre o assunto. Foi realizado um estudo clínico duplo-cego em pacientes que sofriam de Epilepsia, relatado por Mechoulam, Carlini e Cunha. Os pacientes, embora estivessem recebendo algum outro anticonvulsivante (fenitoina, primidone, clonazepam, carbazepina, trimethadiona e /ou etoximida), foram acompanhados e oito receberam entre 200 e 300 mg de CBD, via oral, por dia, por 4 meses. Um deles não teve melhora e outro melhorou com placebo, sendo que porém quatro deles tiveram as convulsões totalmente abolidas. E apesar destes resultados, no Brasil, a classe médica ignora esse estudo.

Para ampliarmos o uso terapêutico da Cannabis é necessário enfrentarmos o preconceito, as leis obsoletas e proibitivas, especialmente em nosso país, onde não é permitido o plantio, dificultando assim a pesquisa e segregando o usuário de medicamentos artesanais e de uso tradicional.

A partir do ano 2000 os EUA foram descriminalizando e permitindo o cultivo e consumo da maconha, legalizada para uso recreativo e medicinal. Atualmente somente três dos 50 estados dos EUA proíbem o uso de maconha, seja para fins recreativos, seja para fins medicinais. Recentemente, Illinois se tornou o 11^o estado a legalizar o uso recreativo (além do medicinal) da maconha. E 33 estados já aprovaram o uso medicinal da cannabis. Entre os 39 estados que não aprovaram o uso da maconha para uso recreativo, 15 descriminalizaram o uso pessoal.

Este é um dado importante uma vez que o EUA são referência para a política de drogas no mundo e agora muitos países modificaram a classificação do Cannabidiol e a Organização Mundial da Saúde que recomenda que não haja leis restritivas ou a necessidade de prescrição médica.

Infelizmente no Brasil a planta deve ser importada já como medicamento, custando em torno de R$ 2.200,00 quando poderíamos plantar e produzir nosso próprio medicamento, com controle, pesquisa e qualidade. Quem necessita acaba recorrendo ao mercado ilegal na busca de medicamentos artesanais, sem garantia de eficácia ou qualidade, vendidos na internet.

O valor terapêutico dos canabinoides é alto demais para ser ignorado e a pesquisa atual reforça a necessidade de entendimento do Sistema Endocanabinóide, descoberto em 1992. A disfunção desse sistema é o que leva ao desenvolvimento de inúmeras doenças, como Anorexia, Dor, Esclerose Múltipla, distúrbios neurodegenerativos como a Doença de Parkinson, Huntington, Síndrome de Tourette, Doença de Alzheimer), Epilepsia, Glaucoma, Osteoporose, Esquizofrenia, distúrbios cardiovasculares, Câncer, Obesidade e distúrbios metabólicos relacionados à síndrome, para citar apenas alguns. E, o entendimento e correção deste desbalanceamento o que promove a melhora da qualidade de vida e, muitas vezes, a cura.

Tendo em vista a toxicidade muito baixa e os efeitos colaterais geralmente benignos desse grupo de compostos presentes na planta Cannabis Sativa, é inaceitável negligenciar ou negar seu potencial clínico, diz Kogan&Mechoulam.

Queremos regulação, legislação que permita à produção e direito à pesquisa científica, embora as histórias clínicas e a qualidade de vida dos usuários/as de CBD/THC nos mostrem que seu uso terapêutico na clínica se impõe como um direito à saúde. É necessário que hoje repensemos uma nova medicina e, fundamentada em pesquisas e estudos clínicos, possamos revisar a legislação restritiva, bem como também os nossos preconceitos e visões de mundo, reconhecendo a importância desse novo sistema, o Sistema Endocanabinóide. Esta é uma luta coletiva para propiciar acesso ao melhor tratamento com melhores resultados e redução de efeitos colaterais adversos.

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https://adai.uw.edu/mcacp/portuguese/

Referências

1.Klein, Zack, 2016.The Scientist ( O cientista). Fundación Canna

_ https://www.youtube.com/watch?v=MwEflxLw-jw&list=PLbvVXS5Xyq8i7b7C-tD1qnUCFPB26G7Hi

2. Kogan NM, Mechoulam R. Cannabinoids in health and disease. Dialogues Clin Neurosci. 2007;9(4):413–430.
3. Mechoulam R, Carlini EA. Toward drugs derived from cannabis. Die Naturwissenschaften. 1978;65:174–9.

4.Carlini EA, Cunha JM. Hypnotic and antiepileptic effects of cannabidiol. J Clin Pharmacol. 1981; 21, 417S-427S.

5.Cunha JM, Carlini EA, Pereira AE, Ramos OL, Pimentel C, Gagliardi R, Sanvito WL, Lander N, and Mechoulam R. Chronic administration of cannabidiol to healthy volunteers and epileptic patients. Pharmacology. 1980; 21, 175-185.